As comunidades e as armadilhas

Para nós que sofremos de alguma forma de disforia de género, por vezes é difícil gerir a nossa identidade online. O problema é que se revelarmos demasiado de nós próprias, e formos demasiado «abertas», com a popularidade dos sites sociais — como o Facebook, por exemplo — é altamente provável que sejamos «apanhadas». Para muitas de nós, isto não é uma opção.

Uma pequena busca na Internet mostrará que, para praticamente todo o tipo de interesses, há vastíssimos grupos de pessoas que se associam de alguma forma. Desde coleccionadores de selos a fãs de surf, há todo o tipo de associações, grupos de interesse, e sites de todos os tipos para apoiar estas comunidades. Na esmagadora maioria dos casos, por muito «estranhos» que sejam os interesses, isso não impede, de todo, que as pessoas se juntem em torno de algo que gostem — tanto fisicamente ou nas discussões online. Através da facilidade com que nos ligamos a outras pessoas com os mesmos interesses no mundo dos sites sociais, encontramos facilmente outras pessoas e locais onde partilhar os nossos gostos com outras pessoas. Ninguém acha «estranho» que, no meio da selva africana, existam clubes de fãs do Benfica. Ou que no Nepal se juntem interessados em colecções de caricas. Tudo isso é normal e aceitável. Mesmo que algum amigo nos pergunte «mas tu, com a tua idade, ainda te interessas por caricas??» podemos apenas encolher os ombros e sorrir. Porque é que coleccionar caricas há-de ser pior do que ficar em casa a ver os Ídolos? Todos temos direito às nossas «manias», desde que não prejudiquem ninguém…

Quando se entra no complexo mundo da disforia de género, tudo é infinitamente mais complicado. Na esmagadora maioria dos países democráticos, já não existem Leis de Moral e Costumes, e qualquer pessoa pode muito bem vestir-se como quiser. Nesses mesmos países também é frequente haver «pontos de encontro» onde pessoas que partilham o gosto do crossdressing se podem juntar. Há grupos de apoio, normalmente com psiquiatras e psicólogos especializados na área, que estão prontos a ajudar para quem queira esse apoio — seja para lidar com eventuais depressões por se sentirem ostracizados, seja para ajudar na transição.

O problema é que em países como Portugal a disforia de género não é «bem encarada». Claro que começam a haver sinais de mudança. A legislação, por exemplo, que era das mais intolerantes e opressivas do mundo democrático, mudou 180º. Hoje em dia, mudar de nome é um mero procedimento burocrático, e não é dos mais complicados, e nem requer cirurgia para mudança de sexo. Por sua fez, a cirurgia de reatribuição sexual deixou de ser um processo complicado, a realizar fora do país às escondidas. É pago pelo Serviço Nacional de Saúde. Não sendo «perfeito» é bem melhor do que existe em muitos outros países. Casais do mesmo sexo, seja qual for, podem legalmente «juntar os trapinhos» sem problema. Ainda há algumas limitações quanto à adopção de crianças, e acredito que possam existir entraves na Justiça relativamente ao poder paternal e à guarda paternal de crianças se um dos cônjuges legalmente mudar de sexo (e especialmente se isso conduzir a divórcio), mas se compararmos com a situação há 10, 15 ou 20 anos atrás, está bem melhor!

Isso não quer dizer que subitamente todas as pessoas com disforia de género tenham vindo para a rua, abrir restaurantes e bares e clubes e livrarias e associações (como, por exemplo, em Madrid…). Antes pelo contrário. A disforia de género pode estar bem defendida (pode-se sempre fazer mais e melhor!) em termos jurídicos e médicos, mas continua a não ser aceite em termos sociais, com uma notável excepção: os comerciantes (especialmente as comerciantes) não fazem qualquer discriminação — um cliente é um cliente, independentemente do seu género e do produto ou serviço que quiser adquirir.

Também não quer dizer que Portugal seja o pior país do mundo para se ter o «azar» de se sofrer de disforia de género: há sítios bem piores! Mas também há sítios melhores. O principal problema que os académicos que estudam este tipo de coisas enfrentam é que é muito difícil, se não impossível, saber quem sofre de disforia de género porque estes não se identificam publicamente.

Olhemos para a Internet em geral. Tudo cresceu! Se há 15 anos atrás já haviam milhares de pessoas nos forums de discussão do Sporting e do Benfica, hoje são milhões — e não se limitam aos forums oficiais, porque é fácil criar um não-oficial e juntar-se à discussão. Se há 15 anos atrás talvez só se encontrasse uma página ou outra na ‘net sobre coleccionismo de caricas, e talvez só de alguém em Lisboa, uma pesquisa hoje no Google dá mais de um milhão de resultados! (Estava a brincar há bocadinho sobre os coleccionadores de caricas no Nepal, mas não é que até há mesmo uma página de caricas do Nepal?!?)

Para quem queira investigar qualquer área do conhecimento humano, a Internet parece ser uma fonte inesgotável de informação. Mesmo que não encontremos exactamente o que queiramos, pelo menos vamos encontrar algo ou alguém que nos possa indicar onde procurar. Isto acontece praticamente com tudo!

Menos na área da disforia de género.

Há mais ou menos 15 anos atrás, lembro-me de ter feito as primeiras pesquisas na Internet sobre o assunto. Um dos sites mais antigos, e que continha preciosa informação sobre o assunto, assim como indicações sobre como se juntar a grupos de apoio, era promovido pela Tri-Ess, uma organização americana que depois tinha links para todos os grupos que conseguiam encontrar, com moradas e contacto. Isto era antes de aparecerem os motores de busca na Internet, pelo que muitas vezes só por «sorte» é que se descobria uma fonte preciosa de informação como esta. Se não me falha a memória, foi mais ou menos por acaso que a descobri. Um amigo meu tinha recentemente instalado uma cópia de um site de histórias eróticas — nessa altura, a Internet era ainda tão lenta que era frequente fazerem-se cópias locais para que as pessoas em Portugal pudessem ter acesso mais rápido — e através disso encontrei alguns grupos de discussão na USENET (uma espécie de mega-forums de discussão online, distribuídos por todo o mundo) que falavam de assuntos ligados à identidade de género, ao crossdressing, ao transgenderismo e à transexualidade. Era assim que se «pesquisava» na ‘net antes de existirem motores de busca.

Ao fim de muitas leituras desses grupos cheguei a encontrar alguém que referia a existência de um site para crossdressers brasileiras. E, nesse site, havia um link para um site muito mais modesto, onde se encontravam algumas crossdressers portuguesas. Era o Crossdressing Club Portugal (CCP), e infelizmente já não se encontra online há muitos anos. Mas ainda consegui descobrir uma lista de associadas da altura (emails cortados para preservar a privacidade):

Alguns nomes serão conhecidos 🙂 e continuam activas por essa ‘net fora.

Também já na altura, para se juntar ao CCP, era preciso que as potenciais associadas se apresentassem e que  justificassem porque queriam aderir. Pretendia-se eliminar desta forma apenas quem estava interessado em experiências sexuais com crossdressers e evitar que o CCP se tornasse num site de encontros (para isso já havia o AdultFriendFinder, a primeira rede social de encontros, que apareceu em 1996).

Eis a minha «candidatura» na altura:

Também as associadas eram fortemente encorajadas a criarem os seus próprios sites (ainda tenho um backup do site referido na imagem acima, com as fotos originais publicadas na altura, mas esse site já desapareceu há muito da ‘net), mas penso que não era «obrigatório», porque, tal como hoje em dia, muitas tinham receio de ser «descobertas».

Não havia mais nada online na altura. É certo que as primeiras organizações LGBT em Portugal começavam a aparecer na ‘net, e algumas começavam mesmo a aceitar o «T» no seu nome. Nessa altura, a força «revolucionária» vinha essencialmente da Jó Bernardo e do seu grupo de amigas mais próximas, que era praticamente o «núcleo» em torno no qual se organizava toda a comunidade transexual e de disforia de género em Portugal. Muitas (incluindo a Jó!) continuam fortemente activistas, a promover publicamente os direitos da comunidade. Mas no CCP não se pensava em activismo, pensava-se mais na partilha de informação e de conhecimentos, e, claro, em encontrar locais onde as crossdressers portuguesas pudessem estar um tempinho juntas sem serem incomodadas. Já nessa altura era na zona do Príncipe Real e Bairro Alto, em Lisboa, que haviam esses pequenos locais onde a comunidade «T» podia estar à vontade.

Quinze anos mais tarde, o que temos?… Online continua a haver muito pouco. A Jó e as suas amigas continuam com os seus sites activistas, promovendo os direitos daqueles que são ostracizados e discriminados pela sua disforia de género — como a Transfofa e a Lara Crespo. Há (felizmente) muitas mais, refiro apenas estes casos porque são pessoas que há mais de uma década que mantém uma presença online como referência para todas nós, e não cessam os seus esforços.

Mas ser-se activista requer exposição pública. Não é algo que esteja ao alcance de todas. E é justamente este o maior problema da comunidade de crossdressers, seja em Portugal, seja no resto do mundo: regra geral, não queremos ser reconhecidas. Queremos, sim, trocar informações, dicas, algum consolo, passar algum tempo juntas — mas não mais do que isso, porque «isso» implicaria revelar publicamente muito mais do que estamos disponíveis para fazer. Quinze anos depois do CCP, existem dois sites activos: o forum de discussão Espartilho, coordenado pela Vanessa Blue, e o Crossdressers em Portugal 3.0, actualmente coordenado pela Valéria Dark. Há alguma sobreposição de participantes (inscritas em ambos), mas o que me mais me surpreendeu é que o número total de membros não é muito superior ao dos do CCP!

Ora isto reflecte bastante bem o problema destas comunidades: mantém-se «escondidas». Deliberadamente. É certo que há mais actividades do que dantes: existem mais bares LGBT, ou pelo menos gay-friendly que não sejam crossdresser-unfriendly, assim como alguns restaurantes que não têm problemas em aceitarem marcações para pessoas com disforia de identidade de género. São poucos mas a comunidade tem marcado muitos mais encontros e festas e tem assistido a mais espectáculos — pelo menos, comparando com o que se fazia em 1995-1997. Mas o número de participantes online não aumentou muito!

Os académicos que estudam estes casos têm justamente um enorme problema a tentar estimar quantas pessoas com disforia de identidade de género existem — seja cá, seja no mundo todo. Os estudos são feitos por amostra e estimativa; dependendo do estudo que se ler, há até quem afirme que 10-15% da população masculina já vestiu roupas de mulher, pelo menos uma vez na vida, de forma deliberada e sentindo prazer. Há quem diga que é um «hábito» regular de cerca de 1% da população masculina, mas é muito difícil confirmar estes valores, porque quem tem esse «hábito regular» recusa-se a dar entrevistas, por mais confidenciais que sejam: sabe-se lá se um amigo ou conhecido não os «apanham» a responder à entrevista… Com a recente legislação em vigor que facilita o processo de transição, conhecem-se pelo menos os casos de quem consulta o Serviço Nacional de Saúde para lidar com a disforia de género. Talvez seja um caso em cada 100.000 habitantes (MtF ou FtM), mais ou menos por ano — é difícil de dizer, porque há muitos casos «antigos» que só surgem agora que a legislação é mais tolerante, e daí os números poderem parecer elevados. Por exemplo, no Reino Unido, o número de homens que por ano se sujeitam a operações de aumento dos seios é cerca de 20 a 50 (depende do ano) — um número bem abaixo do que seria de esperar para a população britânica. (Mas claro que nem todos os transexuais MtF desejam aumentar os seios; muitas ficam satisfeitas com os resultados das hormonas.)

O que conta aqui é realmente a existência de um vasto número de indivíduos que pura e simplesmente não aparece nas estatísticas, porque se recusa a «revelar-se». E isto é bem compreensível! Não é exactamente a mesma coisa que assumir que se é do Benfica numa família de sportinguistas! Se já é mesmo muito complicado no nosso país assumir-se como homossexual — que começam a ser bastante bem tolerados por uma maioria da população (embora ferozmente perseguidos por uma minoria!) — a «tolerância» para com os indíviduos com disforia de identidade de género é perto de nula.

Digo «perto de nula» porque, embora a legislação portuguesa os proteja e proíba a sua discriminação, de forma bem clara e inequívoca, a sociedade não aceita essa legislação. Vamos dar um exemplo simples. Se um homem se assumir como homossexual, mesmo que publicamente, desde que não esteja propriamente a «atacar» os colegas masculinos no local do trabalho, pode exercer a sua profissão livremente. Talvez não o aceitem como Reitor da Universidade Católica, mas, de resto, não terá dificuldades em manter um emprego. Claro que se lhe der na cabeça começar a assediar sexualmente os colegas… isso é diferente! O assédio sexual, seja qual for a orientação sexual, é um crime punido por lei, e justa causa para despedimento. Mas a esmagadora maioria dos homossexuais não estará a pensar em revelar-se no emprego para andar aí à «caça» de um namorado… quer apenas ter um emprego, mais nada, e comportar-se-á de forma adequada para o manter.

Ao contrário do que a maioria da população portuguesa julga, assumir-se como homossexual não implica uma mudança de comportamento e conduta, nem sequer de vestuário. Há concerteza um grupo mais radical que acha que se deve identificar com uma «cultura gay» — e não há mal nenhum nisso! — mas provavelmente nem serão o maior grupo. E mesmo que o sejam! Comparado com muitas culturas alternativas que conheço, a cultura gay estereotipada (porque é principalmente estereótipo e não realidade) é até relativamente soft e praticamente passa despercebida… e é perfeitamente tolerada no meio artístico, nos centros de estética, e até entre marketeers, publicitários, e agências criativas.

Já um indivíduo com disforia de género tem um problema grave. Nenhuma instituição neste país permite que um indivíduo de sexo identificado legalmente como masculino entre no seu local de emprego com roupa claramente feminina. Pura e simplesmente está fora de questão. Nem sequer num cabeleireiro! Assim sendo, quem queira manter o seu sexo identificado legalmente como masculino mas deseje vestir-se no dia-a-dia como mulher, não tem outra hipótese senão assumir uma profissão na área do espectáculo do transformismo, ou, infelizmente, na área do sexo.

Mas mesmo alguém que faça a transição (legal) para o sexo oposto terá sérios problemas. Aqui devemos excluir os casos mais extremos que são considerados casos de sucesso: são indivíduos cuja atribuição de sexo à nascença eram dúbios, e que, por «moda» até aos anos 80 do século passado, eram «forçosamente» classificados (e posteriormente educados) como masculinos. Hoje em dia pretendem a transição. Em muitos destes casos — conhecidos por intersexuais — apresentam características vincadamente femininas, e uma boa terapia hormonal resolver-lhes-á a transição de forma suave e perfeitamente indistinguível da maioria das mulheres. Outros casos existem de indivíduos que tecnicamente não são intersexuais, mas que apresentam uma constituição física andrógina ou já vagamente efeminada, e que com pouca dificuldade podem assumir o papel feminino. Para estes — que são a excepção das excepções — há uma esperança: mudando de cidade, para um sítio que nunca o/a tenham conhecido/a anteriormente, a transição pode ser eficaz e sem levantar quaisquer problemas. Qualquer pessoa contrataria a Filipa Gonçalves em qualquer sítio do mundo.

Para a esmagadora maioria infelizmente não há alternativa: o desejo de se vestir como mulher é algo que não passa despercebido, e, como tal, não é aceite em nenhum posto de trabalho. Mais ainda: a suspeita desse desejo (mesmo que conhecido pela família mais próxima e eventualmente pelo círculo de amigos) pode ser suficiente para a exclusão do posto de trabalho. E, a não ser que não precise de trabalhar para sobreviver, a opção da «revelação» pura e simplesmente não está disponível para a maioria das crossdressers portuguesas.

Mas mesmo noutros países não é fácil. A diferença — e daí haverem muitos mais grupos em certos países — é que existe uma comunidade muito mais alargada. Ou seja, ao invés de existir apenas meia dúzia de bares e restaurantes «T»-friendly, há enormes estruturas de apoio para toda a comunidade. Há lojas em Madrid só para crossdressers. Isto permite, por sua vez, a criação de postos de trabalho para quem não se importe de viver apenas no círculo da comunidade — mas pelo menos existem esses postos de trabalho. Por cá evidentemente que organizações como a ILGA Portugal têm a capacidade de contratar crossdressers para o seu quadro… mas é pouco provável que necessitem de mais gente. Até porque estas organizações nasceram quase todas para defender os direitos dos homossexuais e bisexuais, e só tardiamente se confrontaram com a necessidade de incorporar também o grupo «T» — transgénero — nas suas fileiras, já com a estrutura toda montada. Mesmo os núcleos LGBT dos partidos políticos mais fortemente empenhados em defender os direitos das pessoas transgénero não têm, nos seus grupos parlamentares, membros transgénero, mas apenas LGB. Há até movimentos homossexuais católicos mas não têm elementos transgénero.

Assim sendo, não é de admirar que as comunidades transgénero em Portugal sejam, essencialmente, secretas… no sentido de serem o menos públicas possíveis. Os poucos membros raramente mostram o rosto (com evidentemente muitas saudáveis excepções) e tentam evitar ao máximo ser reconhecidos. Nesta época em que tudo aparece no Google e/ou no Facebook, a exposição pública é muito facilitada, e isto é um factor ainda maior para manter a disforia de género o mais «escondida» possível. Seja para encontrar apoio, seja para saír à noite, os indivíduos com disforia de género vão pensar milhões de vezes antes de darem um pequeno passo que permita que sejam «revelados», porque uma vez que o sejam, não é possível voltar atrás. Que aconteceria se finalmente tivéssemos coragem para falar com um psicólogo na área, e por coincidência, encontrássemos um conhecido na sala de espera (para outra consulta) mesmo no momento da entrada para o gabinete?… ou que o psicólogo, apesar de não lhe reconhecermos o nome, na realidade é o vizinho do 5º andar? Todo esse tipo de coisas é terrivelmente assustador de enfrentar!

Em conclusão, as comunidades de indivíduos com disforia de identidade de género aparentemente não crescem, nem mesmo na Internet, que há muito que deixou de ser «completamente anónima», e onde cada mensagem publicada, cada foto partilhada, aumenta exponencialmente o risco de reconhecimento e consequente ostracismo. Mas isto infelizmente tem o agravamento de mostrar que, se estas comunidades não crescem em lado nenhum, não há necessidade de as «defender» ou de encontrar locais onde sejam bem acolhidas. Por outras palavras: se em quinze anos não se criou um verdadeiro grupo de apoio, com sede física algures, estritamente para lidar com indivíduos com disforia de género — sejam crossdressers, transformistas, travestis, transgénero, transsexuais, ou o nome que se queiram dar a si mesmos — então a probabilidade que isso aconteça agora é muito baixa, porque aparentemente o número de indivíduos é o mesmo… e já na altura eram demasiado poucos para não valer a pena.

Para mim só há uma «luz ao fundo do túnel», que já referi anteriormente. É que, ao contrário do que se passava há quinze anos atrás, os comerciantes não têm qualquer problema com as comunidades de indivíduos transgénero. Nestes forums e grupos de discussão só abundam relatos de como mesmo as crossdressers incapazes de passarem despercebidas (por serem demasiado masculinas, como é o meu caso) não têm qualquer problema em serem atendidas em todo o tipo de lojas, cabeleireiros, centros de estética, sapatarias… Todas temos tido excelentes experiências. No meu caso posso mesmo dizer que nunca fui sequer «vítima» de um olhar mais estranho ou de um comentário «foleiro». Mesmo quando tentava passar mais despercebida, como uma vez a comprar maquilhagem e artigos de beleza no Jumbo das Amoreiras, no meio de vários outros artigos, a empregada apenas sorriu, abanou a cabeça e disse: «Tem piada que me recordei de ter visto outro dia um programa na TV a dizer que haviam muitos homens que compravam maquilhagem para si nos supermercados…» mas nem sequer foi num tom de crítica. Foi no tom de quem sabe que isso acontece diariamente por este país fora mas que ainda não lhe tinha acontecido.

Se houver futuro para as organizações de indivíduos com disforia de género a ultrapassar a barreira da discriminação, será com o apoio do comércio. Isso acho que é positivo!

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